Três novos estudos fora publicados nos Estados Unidos pela revista especializada Nature.
Rio de Janeiro — Os pais têm quatro vezes mais chance que as mães de transmitir aos filhos genes com alterações que poderão resultar no desenvolvimento de autismo, e, quanto mais velhos são, maior o risco. Além disso, a área do cérebro onde ocorrem as falhas genéticas podem elevar o risco de surgimento desta disfunção — que pode ser causada por centenas ou até milhares de genes. Estas foram algumas das descobertas de três novos estudos americanos, que analisaram, ao todo, o genoma de 549 famílias, e cujos resultados foram publicados pela revista especializada “Nature”. No estudo liderado por Evan Eichler, da Universidade de Washington, foram analisados os DNAs de 209 crianças autistas e seus pais. Em alguns casos, estudou-se também o genoma de irmãos que não apresentavam o problema. Os cientistas queriam saber se as falhas genéticas espontâneas que elevam o risco de autismo se originavam nas células sexuais masculinas ou femininas. Descobriram que as mutações ocorriam quatro vezes mais nos espermatozoides, e que, nos homens mais velhos, as alterações eram mais frequentes.
Uma provável razão para isso, segundo Joseph Buxbaum, diretor do Centro de Autismo Seaver e da Escola de Medicina Monte Sinai, em Nova York, é que o homem produz esperma todos os dias, o que eleva a chance de ocorrerem erros no código genético que podem ser transmitidos a seus descendentes.
— Isto nos mostra que a produção de esperma é um processo imperfeito, e basicamente conduzido pela idade do pai, o que faz sentido. À medida em que você envelhece, há mais e mais probabilidade de surgirem problemas — disse Buxbaum à agência Reuters.
Ainda segundo o especialista, esta constatação comprova outras pesquisas segundo as quais homens mais velhos têm maior risco de gerar uma criança que desenvolverá autismo.
Os outros estudos foram conduzidos por Mark Daly, do Instituto Broad, de Havard, e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, e Matthew State, codiretor do Programa de Neurogenética da Universidade de Yale. Juntos, os três trabalhos identificaram algumas centenas de genes suspeitos. As descobertas mostraram ainda que mutações ocorridas na parte do DNA onde as proteínas são programadas teriam um papel importante na desordem: nestes casos, o risco de desenvolver autismo é elevado entre cinco e 20 vezes. Erros genéticos podem ocorrer em qualquer área, mas causam problemas mais graves quando afetam partes do genoma necessárias ao desenvolvimento do cérebro. — Estes resultados mostram que não é o tamanho da anomalia genética que define o risco, mas sim sua localização — afirmou ao jornal britânico “The Telegraph” Thomas Insel, diretor do Instituto Nacional de Saúde Mental americano, um dos Institutos Nacionais de Saúde, que financiou um dos trabalhos.
Muitos dos pesquisadores integram o Sequenciamento Colaborativo do Autismo, o maior projeto dedicado a usar esta tecnologia para identificar os pilares genéticos do problema. O autismo engloba um amplo espectro de desordens, que vão de profunda inabilidade para se comunicar e retardo mental a sintomas relativamente leves, como na Síndrome de Asperger.
Nos Estados Unidos, uma em cada 88 crianças têm autismo, segundo estimativa dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças. No Brasil, não existem dados oficiais, segundo a neuropsicóloga Roberta de Sousa Marcello, especializada em saúde mental e desenvolvimento pela Santa Casa de Misericórdia, em terapia cognitivo-comportamental pela Uerj e coordenadora do Instituto Priorit, que atende crianças com esta condição. Mas, estudos estão em desenvolvimento, e acredita-se que, de cada 100 ou 150 nascidos, um desenvolva autismo. Embora os cientistas acreditem que a causa da desordem é entre 80% e 90% relacionada a falhas genéticas, na maioria dos casos não é possível traçar uma causa hereditária.
Estudos anteriores já haviam mostrado que dezenas de genes poderiam elevar o risco de autismo. Mas as causas genéticas explicam apenas 10% dos casos, e trabalhos recentes, a exemplo do realizado agora pela Universidade de Washington, mostram que fatores ambientais, surgidos provavelmente durante a concepção, também são um potencial gatilho para a disfunção.
— Os fatores causais estão sendo bem estudados ultimamente. Quando falamos de genética, falamos de causas hereditárias e não hereditárias em que o ambiente e situações relacionadas podem interferir e causar mutações genéticas em fases cruciais do desenvolvimento do indivíduo, desde sua gestação até a primeira infância — explica Roberta. — Alguns fatores que podem estar relacionados ao autismo são idade dos pais, infecções, uso de substâncias tóxicas e medicações inadequadas durante a gestação, estresse intenso e prematuridade. Qualquer fator que afetar o desenvolvimento e o amadurecimento do sistema nervoso pode predispor o quadro.
Joseph Buxbaum diz que os resultados dos novos estudos combinados sugerem que entre 600 e 1.200 genes podem elevar o risco de desenvolvimento de autismo. A estratégia, daqui para a frente, é identificar as redes em que eles interagem no cérebro, para, a partir destas informações, desenvolver novos tratamentos:
— Temos agora uma boa noção do grande número de genes envolvidos no autismo. Para os pesquisadores que participaram dos trabalhos, eles apenas arranham a superfície do que ainda será preciso descobrir para entender as causas genéticas do autismo. Mas a abordagem baseada no sequenciamento das mudanças que ocorrem na região onde os genes codificam as proteínas parece ser a melhor alternativa no momento.
— Antes do advento da tecnologia de sequenciamento do DNA, procurávamos no escuro pelos genes do autismo — diz Matthew State, da Univerisdade de Yale. — Agora, temos uma ideia clara do quadro genético e finalmente contamos com ferramentas para encontrar uma grande quantidade dos muitos genes que contribuem para o autismo.
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