Uma das grandes questões dentro do autismo é o fato dos autistas apresentarem uma ampla gama de sintomas. Uns falam outros não, uns apresentam retardo outros não, uns têm altas habilidades outros não. Do mesmo modo é praticamente impossível encontrar dois autistas com as mesmas experiências sensoriais.
Embora os autistas vivam no mesmo mundo físico que as outras pessoas e tenham que lidar com o “mesmo” material bruto que os outros, seu mundo perceptivo é surpreendentemente diferente do de não-autistas. É importante frisar que embora sejam padrões, as experiências sensoriais de cada autista são muito particulares. Esses padrões podem ocorrer nas diferentes modalidades sensoriais, inclusive ao mesmo tempo.
Percepção Gestáltica
A percepção gestáltica é a percepção global de uma cena como se esta fosse uma entidade única na qual todos os detalhes são percebidos de forma simultânea. O problema do autista, então, não parece estar no processamento da cena, mas sim na compreensão de que os pequenos detalhes desta cena são informações com significado que devem ser integradas para formar uma idéia geral ou uma compreensão em um nível conceitual.
Esse tipo de percepção pode ser considerado favorável, na medida em que possibilita aos autistas perceberem as informações de forma mais precisa e em maior quantidade. Por outro lado, como não há uma filtragem, eles não conseguem dar conta de processar tantas informações de forma simultânea, gerando uma sobrecarga. É um fenômeno paradoxal.
Quando um mínimo detalhe do ambiente é alterado, como um objeto trocado de lugar, por exemplo, a cena percebida pelo autista é diferente e não familiar, ou seja, é uma nova gestalt que deve ser processada e isto pode gerar estresse. Outro exemplo é a percepção gestáltica auditiva que se apresenta como uma dificuldade em se concentrar em um único estímulo auditivo. Todos os estímulos como o som de carros, do ar condicionado e da fala das pessoas são percebidos como uma cena única, inseparável.
Intensidade de trabalho dos sentidos
Autistas comumente apresentam hipo ou hipersensibilidades que podem ser experienciadas em todas as modalidades sensoriais. A hiposensibilidade é caracterizada por um alto limiar sensorial enquanto a hipersensibilidade por um baixo limiar. É possível que muitos comportamentos auto-estimulatórios de autistas sirvam para suprimir uma dor ou acalmar, no caso de uma hipersensibilidade, ou ainda para ativar o sistema nervoso e obter estimulação no caso de uma hiposensibilidade. Em alguns casos esses comportamentos também funcionam como fonte de prazer.
Autistas que apresentam uma hiposensibilidade tátil, por exemplo, podem não sentir uma queimadura. Já uma hipersensibilidade auditiva faz com que autistas se sintam incomodados com sons toleráveis ou até mesmo imperceptíveis para não autistas, como o barulho do ar-condicionado.
Perturbação com determinados estímulos
Determinados estímulos aparentemente comuns podem causar incômodo e até dor para alguns autistas. Esses estímulos causadores de perturbação variam de acordo com cada indivíduo. O assobio, por exemplo, pode ser intolerável para determinados autistas. Alguns autistas também ficam perturbados com o toque do telefone e podem até quebrá-lo com medo dele tocar.
Fascinação por determinados estímulos
Estímulos específicos não muito comuns pode ser fonte de extremo prazer e funcionar como calmantes para alguns autistas. Muitos autistas, por exemplo, são capazes de ficar horas fixados no arco-íris que emana de um cristal em movimento.
Percepção flutuante
É muito comum o mesmo autista apresentar uma flutuação entre os estados de hipo e hipersensibilidade. Dessa forma, por exemplo, uma criança que aparenta ser surda em determinadas situações reage fortemente a estímulos sonoros comuns do dia-dia como se estivesse sentindo extrema dor. Do mesmo modo, um alimento favorito pode não ser tolerado em determinados momentos.
Percepção fragmentada
A percepção fragmentada é causada por uma incapacidade de alguns autistas de quebrar a gestalt em partes integradas e significativas. A gestalt é percebida em seus mínimos detalhes, entretanto, cada detalhe é percebido como uma parte independente, desprovido de um significado contextual. Com isso o mundo não é compreendido de forma integrada e holística, mas sim de forma analítica. Uma multidão, por exemplo, não é percebida por um autista como um aglomerado de pessoas, mas sim como um aglomerado de braços, pernas, cabelos, bocas etc... Do mesmo modo, para um autista uma pessoa é reconhecida por pedaços sensoriais armazenados que definem essa pessoa, e não por seu todo. A pessoa, então, é reconhecida pela cor de sua roupa, pelo seu cheiro ou até por seus movimentos. O mesmo acontece com os objetos.
Percepção distorcida
Em muitos relatos encontram-se descrições de alterações na percepção de formas, cores, distâncias e sons, entre outras. Na visão as distorções mais encontradas nos autistas são com relação à profundidade e à noção de espaço, como visão 2D, visão dupla e distorções de tamanho e movimento. Distorções com relação aos proprioceptores podem causar nos autistas problemas na compreensão dos limites físicos e na relação de seu corpo com os objetos no espaço. Por exemplo, um espaço pode ser percebido como maior ou menor do que seu tamanho real. Além disso, pode haver dificuldade para se movimentar no espaço, muitas vezes esbarrando nos objetos.
Ao subir uma escada, por exemplo, o autista pode levantar o pé muito alto, sem a noção exata de profundidade e da posição de seu corpo com relação à escada.
Agnosia
A agnosia é caracterizada por uma dificuldade em interpretar um sentido. No caso, muitas vezes o autista ainda é capaz de sentir (ver, ouvir, etc...), mas apresenta dificuldade em dar significado a essas sensações. É como se fosse cego enquanto enxergasse, surdo enquanto escutasse e assim por diante. Muitas vezes, por exemplo, autistas se comportam como surdos, não reagindo a nenhum tipo de som e não compreendendo o que é esperado.
Percepção atrasada
Percepção atrasada se caracteriza por respostas demoradas a estímulos. Isto pode ocorrer em todos os canais sensoriais. Devido a esse atraso, autistas podem precisar de mais tempo para processar uma pergunta e elaborar uma resposta. Freqüentemente, quando uma resposta é imediata, ela não foi muito elaborada, e sim dada pelo “piloto automático”como chamam, ativado por memórias específicas. Na maioria das vezes, antes de responder adequadamente a uma pergunta o autista passa por inúmeros estágios de percepção, e se por algum motivo essas etapas são interrompidas, todo o processo deve ser recomeçado. Isso faz com que experienciem o significado das coisas fora do contexto, o que gera uma incapacidade de generalização, uma vez que uma nova experiência não consegue ser associada a nenhuma experiência prévia. A resistência à mudança também pode ser explicada por este motivo.
Vulnerabilidade a sobrecarga sensorial
Muitos autistas são vulneráveis a uma sobrecarga sensorial, e em geral isto acontece em situações que não incomodariam não-autistas. Isto pode ser chamado de regra da última gota. Se a “caneca interna” do autista já estiver cheia, seja lá por qual motivo, a mínima gota a mais causará uma sobrecarga. Esse fenômeno é muito variável, na medida em que em determinados dias a caneca pode estar vazia e não se sobrecarregar com a mesma mínima gota. A sobrecarga sensorial parece não estar relacionada a nenhum estímulo específico como, por exemplo, um som alto e agudo como acontece na hipersensibilidade, mas sim à quantidade e à duração de estímulos sonoros simultâneos e à relação input sensorial/capacidade de processamento. A variação do limiar para o processamento dos estímulos sensoriais pode ocorrer em função do ambiente e também da idade
Monoprocessamento
O monoprocessamento acontece quando somente uma modalidade por vez é processada pelo cérebro. Embora sirva como um mecanismo de defesa pode ser prejudicial uma vez que com o foco em somente um sentido, o autista acaba perdendo as informações com relação ao contexto das situações. O monoprocessamento pode ser considerado muitas vezes como um paradoxo. Para evitar uma sobrecarga sensorial ou uma hipersensibilidade, por exemplo, o autista pode passar a processar somente o som.
Com o foco somente nessa modalidade, o som passa a ser experienciado como mais alto já que toda sua atenção está voltada para ele, o que pode acabar gerando uma hipersensibilidade.
Percepção periférica
Muitos autistas evitam a percepção direta como, por exemplo, o contato visual.
Com relação a isso se levanta a possibilidade de o problema em se fazer esse tipo de contato estar na intolerância ao movimento dos olhos da outra pessoa.
A percepção periférica, entretanto, também pode ocorrer com outros sentidos. Alguns autistas relatam compreender melhor uma instrução quando a mesma não é direcionada para eles, e sim para uma parede próxima, por exemplo.
Desligamento dos sistemas (shutdowns)
Muitas vezes os autistas experienciam uma sobrecarga sensorial tão grande que gera o desligamento dos sistemas. Isso prejudica seu funcionamento normal, uma vez que a informação sensorial não consegue mais ser processada. Pode haver um desligamento total quando nenhum sistema sensorial consegue processar as informações ou parcial, quando alguns sistemas continuam funcionando. Esse mecanismo também é utilizado para evitar uma sobrecarga sensorial.
Compensação
Em função da hipersensibilidade, da percepção fragmentada ou distorcida, do processamento atrasado e da agnosia sensorial, entre outras, um sentido sozinho não é nunca suficiente para que o autista consiga dar significado a uma situação. Por conta disso, ele desenvolve estratégias de compensação com outros sentidos para dar significado às coisas. Um autista que esteja com a percepção visual fragmentada, por exemplo, pode bater os objetos para produzir som de modo a reconhecê-los. Muitas vezes também os objetos e pessoas são reconhecidos através do tato e do olfato, que parecem ser os sentidos mais confiáveis para os autistas.
Ressonância
A fascinação extrema por determinados estímulos pode levar o autista a se perder nesse estímulo, é como se ocorresse uma fusão entre os dois. A ressonância diz respeito à habilidade de ver, ouvir, sentir e assim por diante, eventos experienciados por outras pessoas (pensamentos, emoções, dores etc). Muitos autistas também descrevem essa sensação de se sentir parte de um estímulo com relação a outras pessoas e até animais.
Sonhar acordado
Embora não seja muito comum entre os autistas, esse fenômeno de sonhar acordado (daydreaming) muitas vezes chamado de “sexto sentido” aparece em muitos relatos.
Sinestesia
A sinestesia acontece quando a estimulação de uma modalidade sensorial provoca a percepção simultânea em outra. É como se houvesse um cruzamento entre as modalidades sensoriais. Todas as combinações de modalidades podem ocorrer, sendo os sentidos da visão, da audição e do tato os mais freqüentemente envolvidos.
Memória perceptiva
Eventos são lembrados por muitos autistas de forma muito mais detalhada do que não-autistas. As memórias além de visuais podem incluir cheiros e sons experienciados em um determinado momento. A experiência repetida desses cheiros e sons, ou somente o pensamento dos mesmos pode causar a mesma resposta real que causou no evento original, independente do contexto.
A grande questão envolvendo esse tipo de memória é que na maioria das vezes, embora os autistas sejam capazes de apreender, guardar e reproduzir não só os modelos visuais, mas também os auditivos, os motores e os verbais mais complexos, aparentemente não levam em conta seu contexto, importância ou sentido.
Memória associativa ou serial
Esse tipo de memória recebe esse nome por se caracterizar por uma série de associações que podem ser iniciadas por determinados objetos, cheiros ou até mesmo palavras. Muitas vezes essas associações acontecem de forma involuntária, sendo de difícil bloqueio.
Da mesma forma que o buscador da Internet encontra palavras específicas, os autistas procuram memórias (auditivas, visuais, etc) que se associem com as palavras escutadas ou faladas.
Pensamento perceptivo
Todas as pessoas do espectro autista pensem de forma detalhada, três tipos de pensamento perceptivo podem ser encontrados no transtorno: o pensamento visual, que envolve imagens específicas, sejam elas estáticas ou em movimento; o pensamento musical ou matemático, que se caracteriza por relações entre padrões e números; e o pensamento lógico que envolve as palavras.
Autora: Roberta Costa Caminha
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