BRINCANTO PLAY: PRAZER EM APRENDER
Autismo

BRINCANTO PLAY: PRAZER EM APRENDER



BRINCANTO PLAY: PRAZER EM APRENDER
Mariene Martins Maciel* e Argemiro de Paula Garcia Filho*

* AFAGA – Associação de Familiares e Amigos da Gente Autista, Bahia.

RESUMO

Este é um relato do atendimento de 42 pessoas autistas, de idades entre 2 e 38 anos, com o método Brincanto Play. Todas recebiam acompanhamento psiquiátrico e 28 eram medicadas. Onze frequentavam escola regular. Quatro iam a fonoaudióloga; uma, a musicoterapeuta e uma, a terapeuta ocupacional. Foram coletadas informações psicossociais dos participantes e suas famílias através de um roteiro e registradas em um relatório, renovado a cada três meses, de forma a avaliar seu desenvolvimento. O método foi desenvolvido pela família de um jovem autista, ao longo de sua infância e se baseia no conhecimento da personalidade e idiossincrasias de cada pessoa assistida, de forma a usar atividades focalizadas nos seus interesses, desejos, medos e aversões. Ludicidade e musicalidade são instrumentos importantes como formas de desenvolver a socialização e comunicação. No atendimento a pessoas autistas de diversas idades, o método apresentou bons resultados, uma vez que todas apresentaram melhoras importantes na sua capacidade de se expressar, estabilizaram seu humor e passaram a tolerar mudanças de rotina e quebras de expectativa.
Palavras-chave: Autismo, Ludicidade e Educação


INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta o método Brincanto Play, criado empiricamente pela família de um jovem autista, unindo lúdico e música (MACIEL & GARCIA FILHO, 2004). Apoiado em autores como Winnicott, Vigostski e Montessori, caracteriza-se por um processo de avaliação próprio, a identificação do comportamento e interesses da pessoa autista e a aplicação nos ambientes que a pessoa frequenta: residência, escola e clínica, privilegiando a interação com os parceiros sociais e a inserção na sociedade, usando as atividades diárias como forma de aprendizado. A AFAGA (Associação de Familiares e Amigos da Gente Autista), em parceria com o CAEEPBA (Centro de Atendimento Educacional Especializado Pestalozzi da Bahia), atendeu 42 pessoas autistas e seus familiares, apresentando-se aqui os resultados observados entre junho de 2008 e setembro de 2009. Destas, 36 foram atendidas regularmente e as demais compareceram de forma esporádica, por dificuldades encontradas pelas famílias.

AUTISMO: UM JEITO DIFERENTE DE SER

Os transtornos globais do desenvolvimento (TGD), ou espectro autista, formam um conjunto de síndromes definidas por alterações em três áreas (socialização, comunicação e movimentos ou interesses restritos) que se desenvolvem em crianças até os três anos de idade. Formam a classe F84 da CID-10 (Classificação Internacional de Doenças da OMS). À exceção da síndrome de Rett, ocorrem quatro vezes mais em homens que mulheres. Seus portadores, na maioria, têm inteligência média, mas há uma parcela significativa de superdotados.
Boa parte das pessoas autistas tem Distúrbio de Integração Sensorial (DIS): seus sentidos podem ser hipo ou hiperdesenvolvidos, com audição, olfato, ou paladar aguçado ou embotado. Sua percepção da dor pode ser anômala.
Não há consenso sobre as causas do autismo. É certo que tem uma causa genética, com disparadores ambientais: em 95,7% dos pares de gêmeos homozigotos em que um dos irmãos tem autismo, o outro também tem (RITVO et alii, 1985). Apresenta-se de formas suaves a severas, podendo se associar a outras síndromes, como X-Frágil. Não há um gene único responsável pelo autismo, mas a interação entre vários deles.
Em 1911, Bleuler cunhou a palavra “autismo” para descrever o alheamento de pacientes com esquizofrenia (GADIA et al., 2004). Leo Kanner e Hans Asperger, separadamente, a usaram em 1943/44 para descrever crianças e jovens com interesse em assuntos restritos, fala “mecânica” e tendência à “mesmice”, que se mostravam alheios às pessoas. A crença de que pessoas autistas “vivem em seu próprio mundo” vem dessa associação com a esquizofrenia.
Kanner estudou onze crianças autistas, descrevendo-as como incapazes de se relacionar da maneira usual com pessoas e situações. Afirmou que não era, como nos esquizofrênicos, a retirada de um relacionamento inicial presente, mas um isolamento autístico primário, que ignoraria tudo que vem do exterior.
Nas duas décadas seguintes, afirmou-se que a frieza das mães seria causa do autismo dos filhos. Cunhou-se a expressão mãe-geladeira, ideia deixada de lado nos anos 1970.
Crianças autistas mostram empobrecimento da teoria da mente, a capacidade inata do ser humano em atribuir pensamentos e sentimentos aos outros (HAPPÉ, 1997). As deficiências sociais e de comunicação das pessoas com autismo derivariam de um déficit nessa habilidade.
O diagnóstico do autismo é dado pela observação do comportamento da pessoa, baseando-se no padrão definido no DSM-IV (manual da Associação Americana de Psiquiatria), junto com a CID-10. Não há testes laboratoriais para sua identificação.
Segundo a OMS, de cada dez mil pessoas, cinco apresentam autismo; segundo a ONU, de cada mil pessoas, seis apresentam algum tipo de TGD. Com base nessas estimativas, o Brasil teria cerca de um milhão de pessoas com TGD e 85.000 pessoas autistas.
As dificuldades de comunicação e socialização resultam em problemas com o aprendizado, mas intervenções específicas podem lhes dar ferramentas para uma vida normal e produtiva. Ainda que não haja panacéia para o autismo, especialistas como Rivière (2004), defendem que a participação e colaboração da família são essenciais no êxito do trabalho com essas pessoas. Embora aparentem estar “fora da realidade”, o convívio com as pessoas autistas mostra que a dificuldade para se comunicar tolhe seu desenvolvimento regular, levando-as ao isolamento. Elas evoluem, aprendem, modificam seu comportamento, como qualquer outra.
Atividades lúdicas são fundamentais para o desenvolvimento e aprendizagem. Felicidade, prazer e interesses espontâneos, aliados ao acolhimento da família, são chaves para a inclusão das pessoas autistas que, como todo ser humano, precisam de afeto, compreensão e paciência, e um ensino adaptado a suas necessidades. A maioria pensa visualmente, com dificuldade de concentração e hiperatividade. Elas têm seu próprio jeito de ver o mundo.

BRINCANTO PLAY: UM MÉTODO TAMANHO FAMÍLIA

O Brincanto Play, à semelhança de outros métodos, foi desenvolvido por uma família ao lidar com o autismo do filho, centrando-se na inclusão familiar, ludicidade, musicalidade e atividades diárias. Isso determinou o nome: “brincanto” enfatiza o lúdico e a música, bem como a expressão “can to play”.
Em vez de reprimir estereotipias e ecolalias, a família redirecionou “manias”, incorporando-as como brincadeiras, buscando fazer do filho uma pessoa feliz, integrada, capaz de aceitar e retribuir contatos físicos como beijos e abraços.

ASPECTOS TEÓRICOS

A personalidade se constrói na relação entre indivíduo e grupo social, afirma Vigotski (2005). O ser humano se constitui na relação com o outro social (OLIVEIRA, 1992): para se humanizar, precisa crescer num ambiente social e interagir com outras pessoas. A vida social é indispensável para o desenvolvimento integral.
Brincar é uma necessidade para todo ser humano. Através dele, a criança adquire conceitos básicos da cultura e da natureza que a cercam, experimentando, com seus semelhantes, as relações sociais que pautarão sua vida adulta. O autismo, grande deficiência na comunicação, tem o brincar e, por consequência, o aprendizado do relacionamento social, prejudicados.
A criança que brinca, para Winnicott (1975), faz emergirem fragmentos oníricos, reestruturando conteúdos inconscientes; aprende a lidar com a realidade interna sem perder o contato com a realidade externa. O brincar é universal e próprio da saúde, porque facilita o crescimento e conduz a relacionamentos grupais, sendo o mesmo uma forma de comunicação.
Como lembra Maluf (2000), brincar juntos reforça laços afetivos. A criança sente-se ao mesmo tempo prestigiada e desafiada, quando o parceiro da brincadeira é um adulto, fazendo descobertas e vivendo experiências que estimulam e enriquecem o aprendizado. A construção saudável da identidade ocorre através de uma crescente socialização: rituais e brincadeiras contribuem para a formação e preservação dos processos cognitivos, afetivo-emocionais e sócio-culturais (OLIVEIRA, 2006).
Klinta (2001) lembra que lidar com a criança com deficiência pede uma postura especial, tratando-a a partir de suas possibilidades para que experimente o sentimento de ser bem-sucedida. Para ajudar uma pessoa autista a se desenvolver, é preciso ajudá-la a ter prazer nas atividades propostas e no contato com o outro. Cunha (2002) defende que é preciso desenvolver empatia com ela, para captar o que seria adequado à sua forma de se expressar. Fazer o que ela está fazendo pode ser um bom começo; imitando-a, buscamos sintonia para novas possibilidades. Seu comportamento nunca é aleatório, por estranho que pareça. Não se deve recriminá-la. Conquistar-lhe a confiança permite desvendar o significado de cada comportamento. A pessoa que joga tudo ao chão, que usa qualquer objeto para bater, batucar, jogar, pode estar investigando sons ou buscando modular a audição. A música pode servir para a superação de barreiras de comunicação, dando novos sentidos às suas letras.
Montessori dizia que crianças com deficiência têm o direito de viver e frequentar a escola. Já em 1906, salientava a importância da observação e avaliação para uma pedagogia individualizada. Assim, focalizava as condições do educando e a resposta familiar às suas dificuldades, mostrando que conceitos abstratos podem ser assimilados através de materiais concretos. Para ela, o educador tem três tarefas: ajudar a criança a fazer sozinha, mostrar-lhe as atividades que pode imitar e propor-lhe materiais mais evoluídos.

O MÉTODO

O Brincanto Play consiste de atividades lúdicas, visando capacitar o sujeito autista a interagir socialmente, comunicar-se e desenvolver seu aparato cognitivo.
Na primeira etapa, de identificação e avaliação, registram-se as suas características individuais. Essa coleta de dados é feita através de uma entrevista com seus responsáveis a partir do ROPAI (Roteiro Psicossocial para Avaliação e Intervenção), com mais de cem perguntas sobre a vida, comportamento, relações socioafetivas, situação socioeconômica, habilidades, interesses e aversões, e mais a observação das respostas do sujeito a ações avaliativas do profissional. Esses dados são avaliados e registrados em um relatório que serve de ponto de partida para um processo de avaliação recorrente a cada trimestre. Paralelamente ao atendimento regular, faz-se o registro das atividades realizadas e os resultados alcançados, para subsidiar o processo de reavaliação.
Ciente das idiossincrasias do atendido, planeja-se um ambiente agradável e receptivo, focando os seus interesses, sem recusas. Traça-se um prognóstico, as hipóteses sobre sua evolução futura. Regularmente, deve-se voltar também a esta etapa, revê-la e apontar novos caminhos.
O prognóstico subsidia as indicações e estratégias de atendimento. São apontados profissionais e tratamentos, formas de relacionamento, intervenção e posturas a serem adotados pela família, escola e comunidade, assim como os materiais a serem usados ou evitados. A família precisa estar informada e integrada a todo o processo, permanentemente.
Aceitar, partilhar, fazer junto são posturas que constroem confiança: não se deve mostrar desaprovação ou estranheza. Sem reprovação, a auto-estima cresce e se podem introduzir ações socialmente mais aceitas, abrindo-se o aprendizado. Por exemplo, podemos orientar um processo exploratório ao bater canetas sobre uma folha de papel como baquetas e, daí, mostrar que as marcas que deixam têm sua função.
A estratégia consiste em conduzir ludicamente a pessoa no aprendizado através dos assuntos de seu interesse, para que tenha prazer em prosseguir na aquisição e desenvolvimento de novas habilidades e conhecimentos, que passam a ser prêmios em si mesmos. Não se usam reforçadores. Ter na obtenção do saber uma atividade prazerosa fortalece a auto-estima do indivíduo, dando-lhe instrumentos para avançar.
Cada família tem um repertório de jogos e brincadeiras, parte de sua cultura. Aproveitá-las para a comunicação e desenvolvimento da pessoa autista facilita a sua inclusão no núcleo familiar, primeiro grupo social do qual ela faz parte. Músicas e parlendas de nossas infâncias podem e devem se misturar a músicas consagradas pela mídia e suas paródias.

ATENDIMENTO PELA AFAGA

Em setembro de 2009, eram atendidas pela AFAGA, em parceria com o CAEEPBA, 42 pessoas diagnosticadas com TGD, ou com sintomas, mas sem diagnóstico formalizado. Desse total, vinte procuraram o serviço no segundo semestre de 2009. A faixa etária da clientela variava de 2 anos e 1 mês até 38 anos. Apresentavam grau variado, desde autismo severo a síndrome de Asperger. Uma parcela dos atendidos tinha comorbidades, como X-frágil, cegueira e epilepsia. Desde o início, onze deles frequentavam escola regular; a Afaga tem feito gestões junto às famílias, órgãos públicos e escolas particulares para garantir a inclusão dos demais. Esse trabalho passa por visitas às escolas para colher e levar informações e orientação.
Os seis casos a seguir ilustram a aplicação do método, agrupados em duplas, para comparação. Os nomes são fictícios.
Dupla “A”: Ângela, 25 anos, autista de alto funcionamento, e Augusto, 29 anos, autista severo.
Dupla “B”: Bernardo, 12 anos, pouco verbal, e Berenice, 9 anos, não-verbal. Ambos, autistas severos.
Dupla “C”: Carlos, 6 anos, autista de alto funcionamento, verbal com voz monocórdia, e Clóvis, 3 anos com traços de autismo infantil.
A equipe da Afaga mantém contato com os profissionais de outras áreas responsáveis pelo acompanhamento de seus atendidos para ajustar a linha de intervenção, de forma transdisciplinar. Às famílias, tratadas como aliadas, são indicadas formas para compreender, apoiar, interagir e se relacionar em sintonia com o acompanhamento educacional e terapêutico.

Dupla “A”
ÂNGELA
Inicio: junho 2008. Período: 15 meses.
ROPAI
Passou por duas escolas regulares, mas não permaneceu nelas; está no CAEEPBA há 18 anos. Apresenta ecolalia e palilalia, resiste a mudanças, é opositiva. Fica irritada quando está chovendo.
Tem concentração extraordinária, especialmente ao desenhar ou escrever mas, quando se aproxima o lanche ou a saída, arruma a mochila para se retirar. Tem memória prodigiosa: sabe de cor salmos e hinos bíblicos, a programação de vários canais da TV. Reproduz gravuras com temas religiosos e logomarcas de programas e novelas televisivas; elabora desenhos e pinturas. Escreve em papel sem pauta, em letra de forma e cursiva. Conhece as 4 operações matemáticas. Tem rigidez corporal acentuada, gosta de dançar, mas a mãe não permite.
Observações
Ângela, nos anos anteriores, frequentou atividades em grupo, mas pouco se envolvia com os trabalhos e colegas. Desenhava o tempo todo, por isso a proposta de interação e trabalho conjunto com Augusto.
Propostas
Atuar junto à mãe para que autorize atividades físicas e lhe dê mais autonomia, nas das tarefas do cotidiano e autorização para participar de eventos sociais, culturais e de lazer. Prepará-la para o Exame Supletivo.
Ser inserida nos núcleos de informática, artes plásticas e atividades físicas.
Intervenções
Em agosto de 2008, foi iniciado um programa de treinamento para o Exame Supletivo. Língua Portuguesa é ensinada com base em hinos religiosos e na grade televisiva. Para Ciências, estão sendo utilizadas cantigas de rodas, canções populares e jogos de memória.
Seu atendimento, por vezes, é feito junto com Augusto. Se ela é organizada, concentrada e detalhista, ele tem concentração e organização fracas. Ele aponta, arruma e entrega os lápis a ela, conforme pede cada cor. Como ele tem dificuldade em reconhecer as cores e ela as conhece todas, incluindo as suas tonalidades, trabalha-se com ambos a divisão de tarefas, companheirismo e, com Augusto, cores e tamanho.
A dança foi iniciada no final de setembro de 2009.
Evolução
Ângela tem bom comportamento social, aceita mudanças negociadas. Desde outubro de 2008, sempre conclui as atividades. No início, rejeitou o trabalho em dupla, mas, no final daquele ano, estava mais receptiva.
Propostas de atividades que traz para o atendimento são aproveitadas. Começa à vontade por dez minutos e, depois, faz o que é estabelecido. Da reprodução de passagens da Bíblia e outros textos, passou a pequenas redações. Aprendeu a consultar o dicionário. Tem mostrado afeto, abraçando e beijando a profissional que a atende.

AUGUSTO
Início: agosto 2008. Período: 13 meses.
ROPAI
No CAEEPB desde 1998, afastou-se por um ano. Retornou no segundo semestre de 2008.
Alimenta-se bem e sozinho, dorme tranquilamente; é semidependente nas AVDs. Se comunica com gestos, entende comandos e é rápido nas atividades, o que faz com que, muitas vezes, não as realize bem.
Em casa, atira objetos pela janela. Contrariado, pode ficar de cara amarrada e gritar. Na maior parte do tempo é amável, sorridente e carinhoso. Gosta da cor azul, meios de transporte e o videogame Supermario Brothers. Usa o computador, tecla com força. Não permanece por mais de 20 minutos nas atividades.
Propostas
Trabalhar visando letramento e desenvolvimento da escrita. Basear-se em jogos (identificação e memória) elaborados com personagens do videogame e meios de transportes, e a confecção conjunta de cartões para comunicação utilizando, como matéria prima, encartes publicitários, com preferência pela cor azul.
Intervenções
Augusto gosta de folhear revistas e encartes, mas o fazia com rapidez, diversas páginas de uma só vez. A Profissional deixava-o fazer como gostava e sabia, passando a acompanhá-lo lentamente, procurando, mostrando e nomeando imagens que aprecia, como carros, motos, roupas e objetos azuis.
Evolução
Nos atendimentos individuais ou em dupla com Ângela, permanecia por dois horários seguidos (cerca de uma hora e quarenta minutos). Augusto, que costumava amassar, dobrar e guardar no bolso, ou picotar, qualquer papel ao seu alcance, aprendeu a cuidar do material e pegar só o que é autorizado.
A princípio, não identificava nada. Agora, quando solicitado ou convidado a procurar imagens, as encontra e mostra, com um sorriso. Folhear lentamente o ajudou a melhorar o uso dos teclados do computador e de música que tem em casa.

Dupla “B”
BERNARDO
Início: agosto 2008. Período: 13 meses.
ROPAI
Frequenta o Centro desde 2007; esteve afastado e, em 2008, voltou no segundo semestre. Tem crises constantes de auto e heteroagressão e fobia de estouros, como bombas. Lambe o chão. Senta no colo de qualquer pessoa em qualquer lugar. Abraça, beija e cheira as pessoas. Não tem conceito de volume, peso, conservação da matéria e quantidade, bem como de cor, forma, tamanho e espessura.
Utiliza várias medicações. Sempre está tomando mais de duas. Já mostrou sinais de impregnação, muitas vezes chegando apático ao atendimento.
Fora das crises, quando não está excessivamente medicado, é sorridente, meigo, carinhoso, educado e com boa concentração. Adora tarefas: cobrir traçados, pintar e fazer desenhos livres. Tem grande habilidade para bater bola (basquete), gosta de correr, dançar e pular. A fala é ecolálica, mas consegue se comunicar (ecolalia funcional).
Propostas
Atendimento psicopedagógico cinco vezes por semana. Inclusão nos núcleos de atividades física, informática e audivisuais, inicialmente acompanhado, em turmas pequenas.
Esportes: trabalhar a habilidade com basquete, começando com outro aluno e ampliar a turma gradualmente; Em todos os grupos, deve-se trabalhar visando a redução das crises de auto e heteroagressão, melhora da comunicação e potencialização do seu letramento. Apoio psicológico para a família.
Intervenções
Atividades com bolas, trabalhando cores, tamanho, espaço, medidas, espessura, estouro. Bolas de assoprar, músicas, dessensibilização, visitas domiciliares, na comunidade e com os profissionais que o atendem. Trabalho de socialização no entorno do Centro.
Evolução
Parou de lamber o chão, houve diminuição da auto e heteroagressão, não senta mais no colo das pessoas. Já suporta estouros sem ter crises. Tem reduzido a mania de abraçar, cheirar e beijar a todos. Mostra significativa melhora na comunicação e reconhecimento de cores e tamanhos.

BERENICE.
Início: irregularmente, desde setembro 2008; Período: 11 meses. Regularmente, desde abril de 2009: 5 meses.
ROPAI
Tem medo de caminhões tipo “baú” e veículos fechados, como vans. Segue rituais. Não vai a nenhum lugar sem partir de casa: tem que voltar e sair novamente.
Passa creme hidratante por todo o corpo. Vaidosa, gosta de estar asseada, com os cabelos enfeitados e as sandálias da mãe. Aprecia cabelos longos dos outros, acariciando-os: se estiverem presos, sinaliza que os quer soltos. Também gosta de jogar bolas e dançar.
É irrequieta, não permanece mais de dez minutos em uma atividade no mesmo local. Exige a presença da mãe. Tem comportamento opositivo desafiador: quando contrariada, reage com auto e heteroagressões. A alimentação é irregular, come muitas guloseimas. Sua principal nutrição consiste de sucos.
Propostas
Atendimento psicopedagógico três vezes na semana, inserção acompanhada nos núcleos de atividades físicas, artes e música. Acompanhamento de nutricionista, psiquiatra e neurologista para ela e psicológico para a mãe.
Usar roteiros, cores e números dos ônibus; tipos de veículos na rua, mostrando os veículos que estão passando nas vias públicas e nos estacionamentos das unidades que frequenta. Dessensibilização e conhecimento corporal, usando cremes hidratantes. Trabalhar em grupo com bola, na sala e na quadra. Para a concentração e opositividade, usar catálogos de cosméticos, vestuários, acessórios para cabelo e maquiagens, com ênfase a batons e presilhas. Usar recipientes vazios de cosméticos e frascos vazios de xampus variados.
Intervenções
Trabalho com cosméticos e seus catálogos, fantasias, acessórios para roupas e o corpo, tecidos, retalhos e perucas. Interação em pequenos grupos, jogos na quadra e na sala, dança e música. Pintura com guache. Por vezes, é atendida junto com outra menina, autista e cega.
Evolução
A opositividade se reduziu. Senta-se para realizar pequenas tarefas. Procura a companheira de atendimento para partilhar experiências.
Permanece mais de uma hora no atendimento. A mãe fica fora da sala, visível; ainda é procurada para ser enfeitada ou maquiada. A primeira vez que ficou mais tempo em um único local, permaneceu 30 minutos no ponto de ônibus, com a profissional e a mãe, que lhe mostravam veículos e transeuntes. Em visitas a amigos da mãe, fica mais de 2 horas.
Tem mostrado alegria e maior autoestima, resiste menos a limites.

Dupla “C”
CARLOS
Inicio: julho 2008. Período: 14 meses.
ROPAI
Tem estereotipias, gira objetos e as mãos rente aos olhos. Tem ecolalia funcional, voz monocórdia, não faz contato visual. Hiperléxico, lê e escreve desde cerca de três anos, com boa coordenação motora fina. Mostra interesses restritos, gosta de liquidificadores e ventiladores.
Adora quebra-cabeças, jogos de memória e computador; aprecia carrinhos e músicas, parlendas, travalínguas e histórias infantis. Sabe dizer o endereço, data de nascimento, o nome dos pais e da escola, sabe contar, conhece cores e formas. É afetuoso e sorridente, tranquilo, concentra-se nas atividades, principalmente leituras conjuntas, jogos e exercícios de dessensibilização.
Frequenta a mesma escola desde os três anos, cursando, atualmente, a segunda série do ensino básico. Sente alguma dificuldade em Matemática, mas adora Português e Ciências.
Carlos tem medo de bombas e fogos de artifício, mesmo na TV. Não olha nos olhos, tem Distúrbio de Integração Sensorial (DIS): é hipossensível ao toque e à dor e hipersensível a ruídos. Por vezes, fala tão baixo que é difícil ouvi-lo.
Propostas
Dois atendimentos psicopedagógicos por semana. Inserção nos núcleos de atividades físicas, informática, música e audivisuais. Focar o trabalho na interação social, comunicação, redução da rigidez corporal e aumento da sensibilidade tátil e do contato visual.
Intervenções
Dessensibilização tátil e auditiva; atividades lúdicas para quebrar rituais e desenvolver contato olho a olho.
Evolução
Relaciona-se bem com os colegas na escola, resiste pouco a mudanças, aumentou o contato ocular, reduziu a hipossensibilidade e os movimentos estereotipados.

CLÓVIS.
Inicio: novembro 2008. Período: 10 meses.
ROPAI
Com 2 anos, passou a se isolar, chorando muito. Parou de falar e cantar e só queria ficar com a mãe. Agita as mãos acima da cabeça (flapping) e usa as pessoas como ferramenta.
Gosta de seguir pelo mesmo caminho, reclamando se o trajeto for mudado e não se relaciona com seus pares. Aprecia brinquedos de armar, bichinhos, carrinhos .Gosta de folhear livros e revistas. Diverte-se na areia e adora água, músicas alegres, cachorros e cavalos. É muito apegado a um travesseiro. Tem acrofobia e não gosta de carros com controle remoto. Frequenta pelo segundo ano consecutivo a mesma escola.
Propostas
Dois atendimentos psicopedagógicos por semana. Acompanhamento psiquiátrico, neurológico, fonoaudiológico e musicoterapêutico e psicológico para o núcleo familiar.
Intervenções
Trabalhos com música, figuras de animais, cartões com imagens e palavras. Orientação para a família e atendimento em conjunto com a irmã.
Evolução
Tornou-se expansivo e sorridente. Brinca em grupo com os colegas de escola, sorri para todos quando chega ao Centro. Reduziu as estereotipias, o choro e está muito sociável.
Fala palavras soltas como: JÁ, PAPAI, TITIA, MARQUINHOS, chama as irmãs e nomeia figuras. Concentra-se nas atividades, em especial quando envolvem músicas, e nas brincadeiras com tampas de garrafa PET.

CONCLUSÕES

As pessoas atendidas com o método Brincanto Play mostraram evolução satisfatória. Das 42 pessoas atendidas, 29 passaram por uma reavaliação.
Independentemente do tipo ou grau do TGD, ou da idade da pessoa atendida, os resultados foram expressivamente positivos, aparecendo com pouco tempo de intervenção. De todas, apenas seis receberam intervenções de outro tipo: quatro frequentaram Fonoaudiologia, uma era tratada com Musicoterapia e a sexta, com Terapia Ocupacional. Todas recebiam atendimento psiquiátrico, das quais 28 já vinham sendo medicadas anteriormente. Como se sabe, o efeito de substâncias psicoativas, no autismo, é paliativo, servindo de apoio para outras intervenções.

REFERÊNCIAS

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