Entrevista Dra. Carla Gikovate
Autismo

Entrevista Dra. Carla Gikovate


Programa Especial sobre AUTISMO com Fernando Cotta e Carla Gikovate


Edição de 13/11/2007 dedicada ao autismo que contou com a participação de Fernando Cotta, fundador do Movimento Orgulho Autista Brasil, de Brasília. Pai de Fernandinho, ele revela como o fato de ter um filho autista foi determinante para a criação do movimento, que promove palestras e grupos de discussão sobre o tema, além de dar informações às pessoas que possuem parentes ou amigos com autismo. Para aprofundar o assunto, Juliana Oliveira (apresentadora) entrevista a neurologista infantil Carla Gikovate, que explica como o autismo é desenvolvido nas crianças, as principais características e a melhor forma de lidar com esta deficiência.

TVE - Edição de 13/11/2007 — www.tvebrasil.com.br/programaespecial

Transcrição da entrevista de Carla Gikovate no programa especial para Juliana Oliveira.

Juliana : Quem está aqui ao meu lado é a Carla Gikovate. Ela é neurologista e mestra em psicologia. A Carla é especialista em atender o autismo. Carla, eu queria que você descrevesse para a gente o conceito de autismo.

Carla: O autismo é definido como um conjunto de comportamentos. Seriam pessoas que têm dificuldade de comunicação, para falar, ou para se comunicar, ou para manter um diálogo. Existiria uma dificuldade social, que pode ir desde um isolamento completo até uma dificuldade sutil, para uma piada, para uma brincadeira, levar tudo ao pé da letra. E existe uma tendência a repetição, ser metódico, a ter um assunto preferido, assim, muito vinculado a um determinado assunto. Esse tripé: a dificuldade social, de comunicação e de linguagem, é o que compõe o diagnóstico de autismo. E tem os diferentes graus, graus mais severos e graus mais leves.

Juliana: Fala um pouco sobre essa diferença de graus.

Carla: Você tem, assim, desde um autista que não fala, que tem um isolamento social muito importante, manias a ponto de ficar num cantinho fazendo aqueles movimentos de troco, que é o que todo mundo mais se lembra do autismo, até autistas com nível superior, casados, quer dizer, pessoas que têm dificuldade para entender numa cena, uma situação, o que o outro está pensando, o que o outro está sentindo, pessoas que tem ainda, apesar de ter um bom funcionamento, uma tendência a repetição e a ser muito metódico. Então, os graus vão desde o isolamento social quase completo até uma pessoa que é inábil socialmente. E da mesma maneira, desde uma pessoa que não fala até uma pessoa que tem dificuldades com sutileza de linguagem, como uma piada ou uma metáfora.

Juliana: E como os pais podem perceber que o seu filho tem autismo e iniciar um tratamento para isso?

Carla: Você tem crianças que desde bebê pequeno já tem alguns sintomas de autismo. Quer dizer, não olha bem para o olho da mãe, na idade de começar a apontar, que é ao redor de 12 meses, não apontam, não dão tchau, não mandam beijos, aquelas brincadeira de neném, de você falar e quando você parar de falar o neném fazer um barulhinho. Esses são os sinais mais precoces. Setenta por cento das crianças já têm esses sinais de que vão ter algum grau de autismo, no primeiro ano de vida. Mas, você tem 30% das crianças que vão sem nenhuma dificuldade nos primeiros 18 meses de vida e depois começam a perder algumas palavrinhas que já falavam, começam a perder o seu contato social que tinham, param de apontar, param de dar tchau. Então esses são os sinais precoces, pode ou nascer com eles ou desenvolver de 18 meses para frente. Pode ser que isso represente duas situações biológicas diferentes. Pode ser que signifique a mesma coisa, mas que por algum motivo houve uma quebra no desenvolvimento. Essas respostas a gente ainda não tem.

Juliana: O autismo tem uma causa específica?

Carla: Provavelmente, tem múltiplas causas. Quer dizer, dentro de um grupo grande de pessoas com autismo, tem algumas que podem ter origem genética, algumas que podem ter origem em algum tipo de infecção na gravidez, algumas podem ter algum tipo de relação com virose na primeira infância. Mas, não vai sair como uma causa. Como é uma síndrome de comportamentos que varia em grau e severidade, provavelmente, você vai encontrar várias causas. E estão começando a serem mapeadas melhor, essas causas.

Juliana: E uma vez diagnosticado, qual o tratamento recomendado?

Carla: O tratamento, é um tratamento voltado para onde estão as dificuldades. Então, se você tem dificuldade de comunicação, é um tratamento onde você vai tentar encontrar as vias para aumentar a comunicação. Então,uma criança de um ano e meio que não aponta, a gente vai ensinar a apontar, vai ensinar a imitar. Quer dizer, uma criança com desenvolvimento típico, a gente não ensina a imitar, ela já nasce sabendo. A gente abre a boca, o bebê abre a boca imitando. Você tem crianças com autismo que ainda não tem a possibilidade de imitar, só que todo aprendizado social ele se dá por imitação. A gente aprende a falar por imitação, a gente aprende os gestos que na nossa sociedade se usa, cumprimentar, mandar um beijo, socialmente, é através da imitação. Então, a base de tratamento de autismo de uma criança pequena é ensinar a imitar, ensinar a função da comunicação, quer dizer, o prazer de brincar, o prazer de brincar usando a imaginação, que é uma coisa que eles também têm dificuldade. Cada faixa etária, cada momento existem prioridades diferentes. Se você já está numa fase onde a criança já fala, já está alfabetizada, aí as suas prioridades são outras. Talvez a interpretação das entrelinhas sociais, o que quis dizer aquela situação lá, "A pessoa falou aquilo porquê?". Ela falou que você entregou um presente e a criança disse assim: "Esse eu já tenho." Aí, você ensina: "A gente não diz isso porque senão o outro vai ficar triste com aquela situação." Então, existe um ensinamento de prioridades, dependendo da faixa etária e do grau do autismo.

Juliana: E que profissional é esse que vai tratar o autismo?

Carla: Tem diferentes profissionais que podem ser úteis, cada um na sua situação. O importante é ser um profissional que goste e que tenha uma relativa especialização nisso. Porque é uma situação que demanda conhecimentos específicos do autismo para saber o que fazer. Então, pode ser um psicólogo, pode ser uma fonoaudióloga, pode ser uma terapeuta ocupacional. O importante é que seja alguém que conheça como se dá o tratamento do autismo.

Juliana: Carla, a gente sabe que a estimulação precoce, ou seja, quanto antes iniciar o tratamento melhor. No caso do autismo, se a criança iniciar um tratamento cedo, isso faz diferença no desenvolvimento do grau de severidade do autismo?

Carla: Completamente. Então, na verdade, você pode pegar uma criança de dois anos que parece ter um quadro muito severo, que não tem contato, que não olha no olho, que não aponta, que não emite nenhum som, que ignora, parece ser surdo quando você fala, mas com uma intervenção, nada impede que esse autista se transforme num autista bem leve. E, hoje em dia, a gente sabe que tem um pequeno percentual das crianças com quadro de autismo que saem completamente do quadro do autismo. Essa estatística é entre 7 e 12% das crianças, com diagnóstico com autismo nos dois primeiros anos de vida. Se você fizer uma intervenção, bem feita, esse percentual sai completamente do quadro.

Juliana: O que você diria para uma família que tem um autista?

Carla: Olha, a primeira coisa que eu diria, isso não foi causado por vocês, não tem nada que vocês poderiam ter feito para evitar, nem nada do que vocês fizeram causou essa situação. Porque isso ainda, apesar de cientificamente não ter nenhuma base, ainda é usado que o autismo foi causado por um trauma, por uma questão familiar. Então, primeiro, não se sinta culpado, pelo contrário. Quer dizer, você é uma pessoa muito valiosa, que tem que conduzir uma situação muito difícil, muito pesada no dia-a-dia. É muito frustrante especificamente no autismo, essa falta de troca. Que ,às vezes, você tem um empenho enorme, anos a fio de empenho afetivo, que é um empenho afetivo que nem sempre você tem esse retorno afetivo na mesma medida. Quer dizer, o sonho, da maior parte das mães de autista, é um dia a criança olhar e falar assim: "Você é minha mãe. Eu te reconheço como minha mãe. Eu amo você como minha mãe." E, nem sempre isso chega e isso é muito duro. Mas, apesar disso, são pessoas bem cuidadas, amadas, que em alguma medida, mesmo que não tenham essa possibilidade de verbalizar isso, se sentem acolhidas, se sentem queridas nas suas famílias.

Juliana: E como a gente pode incluir o autista na sociedade?

Carla: É claro que isso depende do grau de autismo e também da faixa etária. Então, se a gente imaginar uma criança de baixa idade, dois, três, quatro anos, com autismo, é viável incluí-la numa escola regular. Muitas vezes, a gente usa um acompanhante para poder fazer com que esse contato, um para um e trazer essa criança para o grupo, aconteça de verdade. Com o passar do tempo, vamos supor, uma criança com oito, dez anos de idade que ainda não fala, vai ficando mais difícil a inclusão dela numa escola regular. Porque na faixa etária dela, as crianças já vão estar alfabetizadas, o currículo de uma sala de aula já muito sentado numa cadeira, às vezes ela não consegue. Aí, chega em alguns momentos, a situação, de você reavaliar: "Não, a gente fez todo o programa possível, até uma determinada idade, para que essa criança fosse incluída numa escola regular." Ás vezes, chega um momento de você entender que o melhor para aquela criança é ir para uma instituição especializada. Onde você tem técnicas específicas para você tentar realizar uma comunicação, seja falando ou através de cartões. Você tem métodos que você usa figuras para que a criança possa dizer o que ela quer. E depois, vamos colocar uma outra faixa etária, ela cresceu e você tem aquele percentual, você tem uma fatia das pessoas com autismo que chega a 25%, que nunca vão se tornar verbais. E aí, chega a um momento que você tem um adulto, uma pessoa de 20, 25, 30 anos com um autismo que ainda não fala, a maneira de incluir, ela é totalmente diferente do que seria para uma criança de dois anos. E aí, você pode imaginar que seja interessante esses pais se associarem, criarem grupo de pais, onde você tem atividades e possibilidades. Vamos supor, uma atividade num clube onde você possa usar uma piscina, onde esses adultos com autismo possam participar. E as famílias também teriam a oportunidade de ter uma vida social entre elas, trocar idéias. É uma situação muito difícil, muito pesada no dia-a-dia, muito solitário. Às vezes, essa inclusão social de um autista grave e adulto, passa muito mais pelos pais se agruparem por criarem associações de pais onde essas pessoas possam ter um bom convívio e as famílias terem uma qualidade de vida menos isolada. Porque é uma situação que isola muito as próprias famílias. O autismo não é uma coisa rara. Hoje em dia, as estatísticas de outros países, a gente aqui não tem uma estatística tão bem desenhada e reafirmada, chega que 1% da população mundial tem algum grau de autismo e as pessoas não conhecem. A criança com autismo joga água em alguém ou faz alguma coisa que parece mal criada, muitas vezes eles vão ouvir declarações enormes de outros pais de como eles não souberam educar os seus filhos. Então, eu acho que numa situação onde te constrangem te dizendo que você que educou mal, é muito correto dizer: "Olha, não é uma questão de educação, ele tem autismo. Poderia ter acontecido na sua casa, como aconteceu na minha."

Juliana: Então, o que você diria para essa sociedade, para receber melhor o autista?

Carla: Eu acho que deve existir um encontro entre você trabalhar o autista para que ele se dirija em direção a expectativa da nossa sociedade e acho que a nossa sociedade tem que conhecer um pouco do que se passa na maneira de funcionar, ver e viver no autismo para que suavize esse convívio.

Juliana: Carla, toda vez que a gente fala sobre autismo, no Programa, a repercussão é muito grande. A gente sente que as pessoas querem saber mais sobre esse assunto. Quem quiser falar mais sobre o autismo, saber mais informações, como pode fazer?

Carla: Tem um site que eu fizer para isso, quer dizer, para gerar informação e tem vários links também, que é o: www.carlagikovate.com.br. Uti



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